Com o desenvolvimento do capitalismo corporativo e de iniciativas empresariais voltadas à inovação no mundo dos negócios depois da década de 90, as agendas dos fóruns internacionais passaram a se modificar e a dar espaço para novos assuntos que antes eram marginalizados, como o meio ambiente e os direitos sociais como um todo. Com a centralização desses temas nas discussões de grandes organizações e Estados, passou-se a dar uma importância maior ao impacto positivo de ações sustentáveis e sociais, inclusive pelas empresas que têm um modelo estruturado de governança, com uma rede mais complexa de funcionários.
Integrando esse novo sistema aos modelos de negócios, as empresas começam a garantir maior lisura nos trâmites corporativos, sendo mais transparentes em relação a suas políticas. Além disso, esses novos padrões começam a operar como forma de medir a performance, reputação e, inclusive, lucro.
Nesse sentido, as organizações passaram a incorporar em suas rotinas e planejamentos, uma sigla que está cada vez mais evidente no mundo corporativo: ESG – Environmental, Social e Governance (ambiental, social e governança, em português). As empresas que pretendem atuar dentro da denominação precisarão evidenciar o desenvolvimento de inovações que se enquadrem nesse tripé, além de desenvolver a intenção de colocar em prática novas soluções, materiais e tecnologias sustentáveis.
É aí que entra em cena a Propriedade Intelectual, pois os profissionais desta área são peças essenciais para uma eficaz aplicação da tendência internacional ESG pelas empresas que possuem tal objetivo, uma vez que há diversas possibilidades das instituições explorarem a Propriedade Intelectual com o viés sustentável.
A Propriedade Intelectual faz parte de todo processo de inovação, de forma que um bom conhecimento na área articula um desenvolvimento seguro nas empresas. O ato de buscar a proteção de seus ativos quando feito com viés ESG, além de agregar valor, pode ser uma forma de certificar a sustentabilidade daquela tecnologia, colaborando com objetivos coletivos de melhoria de performance social e ambiental.
INPI e aplicação do ESG
Em 2023 o INPI conquistou o selo pela implementação de agenda ambiental A3P (selo Agenda Ambiental na Administração Pública, concedido pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima). A A3P é uma maneira eficaz do Ministério incentivar a prática de ações relacionadas à sustentabilidade dentro da Administração Pública, e consequentemente efetivar o ESG dentro dos órgãos públicos brasileiros. A obtenção desse selo pelo INPI, órgão responsável pela regulamentação e ativos de propriedade industrial no Brasil, demonstra que é um instituto que incentiva e busca aplicar ações para que as empresas implementem o ESG em seus sistemas.
Exemplo disso é a prioridade de exame conferida à pedidos de patente de invenções de tecnologia verde (Resolução nº 239 de 04-06-19/INPI), que o INPI regulamentou em 2019. Através de análise do cenário atual, conclui-se que por conta do backlog na fila de exame de patentes, um pedido de invenção leva em média 5 a 6 anos para ser concedido. Uma vez que o INPI viabiliza direito de prioridade aos exames de invenções de tecnologia verde, entende-se possível a redução desse tempo para um pedido se tornar carta-patente, um acontecimento vantajoso no viés empresa/organização.
Transição energética - Patente
Em consonância com o raciocínio de direito de patente, vale exemplificar com o caso prático de Transição energética. Essa pauta compreende à otimização da utilização de bens e serviços, conjuntamente com uma reestruturação social, econômica, política e cultural, de forma a alcançar a geração e consumo de energia de baixo carbono. Além disso, pressupõe que a maneira com que o alto consumo dos recursos naturais como tem sido feito atualmente, é inteiramente insustentável em diversos aspectos também corporativos, inclusive economicamente.
Esse assunto se relaciona com o termo “environment”, que é o aspecto ambiental do tripé ESG, uma vez que busca alternativas para diminuição do aquecimento global através da transição do principal método de geração energética (que utiliza alta produção de carbono), para outro mais sustentável. Tal relação, se desdobra para a vinculação com Propriedade Intelectual uma vez que nasce a necessidade de inovações sustentáveis por parte das empresas, de forma a viabilizar o objetivo da transição energética para fontes mais limpas.
Indicações Geográficas
As indicações geográficas fazem parte de uma gama muito importante da Propriedade Intelectual, pois identificam um produto como originário de certo local, certificando sua qualidade e outras características. A proteção desses bens agrega lucro e é de grande interesse dos produtores, que investiram em determinado local e se beneficiam da reputação associada a ele e aos produtos. Tal proteção também auxilia os consumidores a identificarem procedência e qualidade da mercadoria. O maior benefício da proteção via
Indicação Geográfica certamente é o desenvolvimento socioeconômico da localidade produtora.
Entende-se que a inserção das IGs estimula a valorização e a proteção das atividades de certo local, agregando progresso econômico, social, ambiental e a valorização do patrimônio cultural, articulando fatores que promovem cidadania, capacidades ambientais e melhores condições de renda. Essa perspectiva está totalmente alinhada aos objetivos ESG, de forma que o desenvolvimento da Propriedade Intelectual se vê totalmente nivelado aos valores agora estabelecidos globalmente como necessários ao crescimento sustentável.
Entretanto, seu principal obstáculo está na formulação de uma política pública capaz de atender às particularidades de cada produto. É importante mantermos uma visão inovadora relacionada ao desenvolvimento da política de IGs, para seja possível adequar as sistemáticas às diferentes mercadorias e localidades que podem ser beneficiadas por essa proteção.
Marcas de certificação
As marcas de certificação fazem parte de um nicho importante da PI, em consonância com empresas que procuram implementar a ESG e consumidores que buscam um consumo mais consciente. O uso dessa proteção pode ser uma ferramenta poderosa a corporações que procuram mostrar seu comprometimento com a sustentabilidade e transparência, além de atenderem cada vez maiores expectativas de clientes e colaboradores que exigem responsabilidade e políticas verdes.
A utilização desse recurso de proteção tem diversos benefícios à empresa que se associa a ele, como o aumento de sua credibilidade. Fica claro às demais corporações e consumidores que são assegurados certos critérios ambientais, sociais e de governança, indicando que produtos passaram por processos de avaliação rigorosos para que atendam a esses padrões.
Com o aumento de pessoas interessadas em apoiar empresas que demonstram compromisso com agendas verdes e sustentabilidade, o mercado se expande nesse sentido, de forma que instituições e suas marcas de certificação podem se destacar em meio a concorrência, sendo diferenciadas das demais. O alinhamento dos valores dos clientes com os das firmas se vê cada vez mais relevante na escolha de consumo dos indivíduos.
É importante retificar que a implementação de políticas ESG e o uso de marcas de certificação podem ajudar as empresas a reduzir riscos relacionados a questões ambientais, sociais e de governança, como litígios, danos à reputação e instabilidade financeira.
Considerações finais
As novas demandas corporativas que fazem parte do contexto mundial de transformação progressiva pós década de 90, agregadas a outros fatores como a busca da geração dos dias atuais (principalmente geração Y e Z) por consumir produtos e utilizar serviços que não impactem negativamente a sustentabilidade e o meio ambiente, trouxe a necessidade das empresas em implementar um sistema de sinergia entre sustentabilidade e desenvolvimento.
As duas esferas da ESG e Propriedade Intelectual formaram uma intersecção crucial entre a sustentabilidade empresarial e a proteção de bens e instituições. O desenvolvimento e proteção sustentáveis, equidade social corporativa e governança transparente podem ser fundamentais para o crescimento de uma empresa no mercado, gerando valor aos acionistas e fortalecendo sua reputação como uma organização ética e inovadora.
Por outro lado, a Propriedade Intelectual também pode ser uma ferramenta direta de inovação sustentável e de apoio à sociedade como um todo. Por exemplo, e como já citado, patentes podem ser utilizadas para proteger invenções que contribuam para a mitigação das mudanças climáticas, a preservação dos recursos naturais ou o desenvolvimento de tecnologias socialmente inclusivas.
A integração eficaz de práticas de ESG e gestão da Propriedade intelectual resulta em benefícios mútuos para empresas, consumidores e a sociedade como um todo, incluindo a criação de valor sustentável, a redução de riscos e a promoção da inovação com impacto positivo. Essa relação ressalta a importância de uma perspectiva abrangente para a sustentabilidade empresarial, na qual a proteção e o uso estratégico da PI desempenham papel significativo na busca por uma economia mais justa, equitativa e ambientalmente responsável.
Autoras:
Mariana Santos
Assistente de Controladoria Internacional
Núcleo de Propriedade Intelectual
Saiba mais em: https://bit.ly/marianafatima
Stefany A. Santos
Advogada
Núcleo de Propriedade Intelectual
Saiba mais em: https://bit.ly/stefany_santosᅠ
The influence of ESG (Environmental, Social and Governance) on Intellectual Property and its intersections.
With the development of corporate capitalism and business initiatives aimed at innovation in the business world after the 1990s, the agendas of international forums began to change and bring to light new issues that had previously been marginalized, such as the environment and social rights overall. With the centralization of these issues in the discussions of large organizations and states, greater importance has been given to the positive impact of sustainable and social actions, including by companies that have a structured governance model, with a more complex network of employees.
By integrating this new system into their business models, companies are beginning to ensure greater smoothness in their corporate dealings and are more transparent about their policies. In addition, these new standards are beginning to operate as a way of measuring performance, reputation and even profit.
In this sense, organizations have started to incorporate into their routines and planning an acronym that is increasingly evident in the corporate world: ESG - Environmental, Social and Governance. Companies wishing to act within this denomination will need to demonstrate the development of innovations that fit into this base, as well as developing the intention to put new sustainable solutions, materials and technologies into practice.
This is where Intellectual Property comes into the picture, as professionals in this area are essential for the effective application of the international ESG trend by companies with this objective, since there are several possibilities for institutions to explore Intellectual Property with a sustainable bias.
Intellectual Property is part of every innovation process, so a good knowledge of this area can help companies develop safely. The act of seeking to protect their assets when done with an ESG bias, in addition to adding value, can be a way of certifying the sustainability of that technology, collaborating with collective objectives of improving social and environmental performance.
INPI and the application of ESG
In 2023, INPI was awarded the seal for implementing the A3P environmental agenda (Environmental Agenda in Public Administration seal, awarded by the Ministry of the Environment and Climate Change). The A3P is an effective way for the Ministry to encourage the practice of actions related to sustainability within the Public Administration, and consequently to make the ESG effective within Brazilian public bodies. Obtaining this seal from the INPI, the body responsible for regulating industrial property assets in Brazil, demonstrates that it is an institute that encourages and seeks to implement actions so that companies implement ESG in their systems.
An example of this is the examination priority given to patent applications for green technology inventions (Resolution No. 239 of 04-06-19/INPI), which the INPI regulated in 2019. By analyzing the current scenario, it can be concluded that due to the backlog in the patent examination, an invention application takes an average of 5 to 6 years to be granted. Since the INPI allows priority examination rights for green technology inventions, it is possible to reduce this time for an application to become a patent letter, an advantageous event from a company/organization perspective.
Energy Transition - Patent
In consonance with the reasoning of patent law, it is worth exemplifying the practical case of the Energy Transition. This involves optimizing the use of goods and services, together with social, economic, political and cultural restructuring, in order to achieve low-carbon energy generation and consumption. It also assumes that the current high consumption of natural resources is entirely unsustainable in various corporate aspects, including economically.
This issue is related to the term “environment”, which is the environmental aspect of the ESG base, since it seeks alternatives for reducing global warming through the transition from the main method of energy generation (which uses high carbon production) to a more sustainable one. This relationship unfolds into a connection with Intellectual Property, since the need arises for sustainable innovations on the part of companies, in order to make the goal of the energy transition to cleaner sources viable.
Geographical Indications
Geographical indications are part of a very important range of Intellectual Property, as they identify a product as originating from a certain place, certifying its quality and other characteristics. Protecting these goods adds profit and is of great interest to producers, who have invested in a determined place and benefit from the reputation associated with it and its products. Such protection also helps consumers to identify the origin and quality of the goods. The greatest benefit of Geographical Indication protection is certainly the socio-economic development of the producing locality.
It is known that the inclusion of GIs stimulates the valorization and protection of the activities of a certain location, adding economic, social and environmental progress and the valorization of cultural heritage, articulating factors that promote citizenship, environmental capacities and better income conditions. This perspective is fully aligned with ESG objectives, so that the development of Intellectual Property is fully aligned with the values now established globally as necessary for sustainable growth.
However, its main obstacle is the formulation of a public policy capable of taking into account the particularities of each product. It is important to maintain an innovative vision in relation to the development of GI policy, so that it is possible to adapt the systems to the different goods and locations that can benefit from this protection.
Certification marks
Certification marks are part of an important IP niche, accordantly with companies seeking to implement ESG and consumers seeking more conscious consumption. The use of this protection can be a powerful tool for corporations willing to show their commitment to sustainability and transparency, as well as meeting the ever-increasing expectations of customers and employees who demand responsibility and green policies.
Using this protection feature has several benefits for the company that associates itself with it, such as increasing its credibility. It makes it clear to other corporations and consumers that certain environmental, social and governance criteria are guaranteed, indicating that products have were the subject of rigorous evaluation processes in order to meet these standards.
With the increase in people interested in supporting companies that demonstrate a commitment to green agendas and sustainability, the market is expanding in this direction, in a way that institutions and their certification brands can stand out from the competition by being differentiated from the rest. Aligning the values of clients with those of companies is becoming increasingly important in people's consumer choices.
It is important to note that the implementation of ESG policies and the use of certification marks can help companies reduce risks related to environmental, social and governance issues, such as litigation, reputational damage and financial instability.
Final Considerations
The new corporate demands that are part of the global context of progressive transformation since the 1990s, added to other factors such as the search by today's generation (mainly generation Y and Z) to consume products and use services that do not negatively impact sustainability and the environment, has brought the perspective of a new need for companies to implement a system of synergy between sustainability and development.
The two spheres of ESG and Intellectual Property have formed a crucial intersection between corporate sustainability and the protection of assets and institutions. Sustainable development and protection, corporate social equity and transparent governance can be fundamental to a company's growth in the market, generating shareholder value and strengthening its reputation as an ethical and innovative organization.
On the other hand, Intellectual Property can also be a direct tool for sustainable innovation and support for society overall. For example, and as already mentioned, patents can be used to protect inventions that contribute to mitigating climate change, preserving natural resources or developing socially inclusive technologies.
The effective integration of ESG practices and IP management results in mutual benefits for companies, consumers and society, including the creation of sustainable value, the reduction of risks and the promotion of innovation with a positive impact. This relationship highlights the importance of a comprehensive perspective on business sustainability, in which the protection and strategic use of IP play a significant role in the quest for a fairer, more equitable and environmentally responsible economy.
Authors:
Mariana Santos
International Control Assistant
Intellectual Property Department
Stefany A. Santos
Associate Attorney
Intellectual Property Department
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